O que é uma pirâmide de evidência?

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Entenda o que é uma Pirâmide de evidência, cada tipo de estudo que a compõe, em que é baseado o grau de recomendação e o melhor: em que situação usar cada tipo de estudo.

Pirâmide de evidência

Os níveis de evidência (também chamados de pirâmide de evidência) foram descritos pela primeira vez em 1979 no Canadá.

Uma pirâmide de evidência é construída por estudos com base na qualidade da metodologia ou do desenho experimental, validade e aplicabilidade ao atendimento ao paciente.

Nessa pirâmide, são classificados os tipos de estudo, de acordo com a evidência clínica e científica que eles possuem. Essas decisões dão o “grau (ou força) da recomendação”.

Por isso nas diretrizes terapêuticas para hipertensão, por exemplo, fala sobre os diferentes graus de recomendação 1, 2 ou 3, ou seja, o nível 1 é o maior, isso significa que aquela informação é consensual entre os médicos.

A classificação dos níveis de evidência foi motivada pela necessidade de usar o conhecimento científico como suporte na prática clínica, pois devido ao grande número de publicações, não é qualquer estudo que pode ser usado para basear uma decisão clínica. Por isso, os estudos são classificados quanto ao tipo e a qualidade.

Tipos de estudo

Antes de mostrar a classificação da pirâmide de evidência, é necessário falarmos um pouco sobre os tipos de estudo.


Imagine que você é um médico ou uma médica e aparece no seu consultório uma pessoa que foi picada por uma cobra que você nunca tinha ouvido falar. Em dúvida sobre qual tratamento prescrever, você faz uma busca de artigos na internet e encontra cinco opções.


Artigo 1: refere-se a um médico chinês que relata o tratamento que ele usou para um caso igual ao seu.
Artigo 2: um médico australiano testou um soro antiveneno associado a um produto natural para um grupo de pacientes com o mesmo caso que o seu e outro grupo que foi picado por diferentes tipos de cobra.
Artigo 3: um estudo acompanhou todos os pacientes americanos que foram picados por cobras entre 2013 e 2015 e avaliou as estratégias de tratamento utilizadas.
Artigo 4: um médico brasileiro desenvolveu um novo tratamento para picada da cobra e testou esse produto em dois grupos (em um testou o produto novo, no outro testou um tratamento padrão). Os pacientes foram selecionados de forma aleatória para cada grupo e a pessoa que administrou o novo soro, não sabia a que grupo cada paciente pertencia.

Artigo 5: uma análise de 37 trabalhos que selecionaram os pacientes de forma aleatória e testaram dentre todas as opções de tratamento, qual a melhor para a picada da cobra que você está pesquisando.


Diante desses trabalhos, qual você escolheria para tomar a decisão e prescrever o tratamento adequado para o seu paciente?


Se a sua resposta foi artigo 5, você acertou!

Observe que eu te falei como os estudos foram realizados, ou seja, o desenho experimental, e é isso que define o tipo de artigo.

O artigo 1 é um relato de caso, que é quando o profissional relata o caso de de um paciente, a respeito de uma doença rara, nova técnica de diagnóstico ou tratamento.

O artigo 2 é um caso-controle, pois compara um grupo de indivíduos expostos a mesma picada de cobra do seu paciente com um grupo que foi picado por diferentes tipos de cobra.

O artigo 3 é uma coorte, pois avalia ao longo de 2 anos qual o melhor tratamento para aqueles pacientes picados por cobra.

O artigo 4 é um ensaio clínico randomizado, pois aborda aleatorização (randomização) na definição dos grupos e cegamento dos investigadores (o investigador que administra o tratamento, não sabe a que grupo cada paciente pertence).

O artigo 5 é uma revisão sistemática, pois aborda o que diversos artigos falam dando a melhor resposta). Caso você queira se aprofundar nesses tipos de artigo, sugiro as seguintes leituras:

Estudo de caso-controle: http://files.bvs.br/upload/S/0100-7254/2015/v43n4/a5310.pdf
Estudo de coorte: http://files.bvs.br/upload/S/0100-7254/2015/v43n3/a5116.pdf
Ensaio clínico randomizado: http://files.bvs.br/upload/S/0100-7254/2015/v43n1/a4842.pdf
Artigo de revisão e relato de caso: http://blog.sejaphd.com/entenda-as-diferencas-dos-3-tipos-de-artigos-cientificos/

Qual o nível de evidência desses estudos?

Os estudos exemplificados acima, podem ser classificados quanto a sua evidência.

O relato e série de casos (quando são relatados alguns casos, por exemplo, algo entre seis e pouco mais de dez pacientes) tem o menor nível de evidência, pois não tem comparação de grupos. Também possuem baixa evidência científica os estudos em animais e células, pois ainda não foram testados em humanos.

Depois do relato de caso, quem vem na pirâmide de evidência é o caso-controle, seguido da coorte, ensaio clínico e por último, a revisão sistemática (a foto inicial desse post, ilustra a disposição dos tipos de estudo na pirâmide).

Uma revisão sistemática, poderia ser de qualquer um dos tipos de estudo aqui exemplificados. Usei uma revisão de ensaio clínico, para mostrar que ela tem um grau de recomendação ainda maior, ou seja é a ”top das tops”.

Por que entre aspas?

Porque se a revisão com metanálise for de um ensaio clínico, ela é top das tops, ou seja, possui maior grau de recomendação, mas se for de um estudo caso-controle, por exemplo, o risco de viés é tão grande (nesse tipo de estudo), que o grau de recomendação para essa metanálise, não pode ser considerado tão alto quanto da metanálise de ensaio clínico.

Nova pirâmide de evidência?

Mesmo a pirâmide de evidência tendo sido proposta em 1979, como uma necessidade para o avanço da medicina, ela está em constante discussão pelos especialistas.

Em 2016, foi pulicado um trabalho interessante na revista BMJ Evidence-Based Medicine, intitulado: New evidence pyramid (Nova pirâmide de evidência – https://ebm.bmj.com/content/21/4/125). Esse artigo traz uma abordagem diferente e que faz sentido. Os autores sugerem um novo olhar para a pirâmide:

Já que uma revisão sistemática pode ser de qualquer tipo de estudo, ela não deve estar no topo e sim como uma lente sobre todos os outros tipos de estudo, pois mostra aos interessados um olhar crítico e aprofunddao sobre determinado tema. Nessa proposta, os ensaios clínicos randomizados aparecem no topo da pirâmide.

Outro olhar curioso dos pesquisadores americanos de Minnesota, é que a pirâmide atual, não reflete as diferenças que existem entre os estudos. Eles propuseram o uso de curvas ao invés de linhas para separar os tipos de estudo na pirâmide. Pois, existem graus de recomendação diferentes, a depender da qualidade metodológica e dos vieses do estudo (confira neste link https://ebm.bmj.com/content/21/4/125 a Figura 1 que ilustra essas propostas).

Essa é uma análise desses pesquisadores, não é uma verdade absoluta, mas nos leva a uma reflexão interessante.

O que determina a qualidade de um estudo?

Para um estudo ser considerado de boa qualidade, é preciso analisar a metodologia, ou seja, o desenho experimental.

O método usado deve descrever de forma clara como a randomização, ou seja, a distribuição aleatória dos pacientes nos grupos, foi feita. Os pacientes foram distribuídos nos grupos de investigação através de sorteio manual, sorteio eletrônico, etc?

Como foi o cegamento dos avaliadores?

Cegamento diz respeito aos investigadores não saberem a que grupo cada paciente pertence, por exemplo, como uma forma de evitar falsos resultados.

Outros aspectos que precisam ser claros no desenho experimental são: Quantos voluntários tem na pesquisa? Quantos desistiram da pesquisa e por quê?

A qualidade da evidência depende de quão bom foi o método usado, com mínimo risco de variáveis confundidoras.

Essa qualidade impulsiona a força da recomendação, que é uma das últimas etapas de uma pesquisa translacional (pesquisa da bancada ao leito do paciente) mais próximas ao atendimento ao paciente.

Por isso que ter estudos com evidência científica ajudam tanto os profissionais da saúde na tomada de decisão com o paciente.

Não é atoa, que os estudos utilizados na elaboração de diretrizes terapêuticas, são as revisões sistemáticas de ensaios clínicos, de preferência com metanálise.

Há muito tempo vivemos na era da medicina baseada em evidência.

Em que situação usar cada tipo de estudo?

Falamos aqui sobre vários tipos de estudo e em que posição eles se encontram na pirâmide de evidências.

Mas você pode se perguntar:

Em que situação uso cada tipo de estudo?

Pois bem, irei fazer um resuminho aqui de qual situação para cada tipo de estudo:

  • Para qualquer pergunta de pesquisa voltada a clínica, você pode fazer uma revisão sistemática. A depender do número de estudos incluídos na revisão, pode-se também fazer uma metanálise.
  • Para avaliar tratamento, etiologia e prevenção, qualquer um dos estudos discutidos aqui, pode ser usado. Ex: estudo com animais, células, estudo/série de casos, caso-controle, coorte, ensaio clínico e revisão sistemática com ou sem metanálise.
  • Diagnóstico: ensaio clínico e coorte.
  • Prognóstico: coorte, caso-controle, série de casos.

O que vai definir o tipo de estudo, vai ser a sua pergunta de pesquisa e a disponibilidade de tempo e infraestrutura que você tem para conduzir a pesquisa.

Ah e eu tenho uma dica extra 🙂

Observe que o nível de evidência não tem nada a ver com fator de impacto. Por exemplo, existem estudos com animais ou com células que tem na pirâmide, evidência menor que os estudos de caso e podem ser publicados em revistas de elevado fator de impacto, como Nature.

Claro, que quanto maior a evidência, relevância e novidade do estudo, será mais fácil publicar em revistas de maior fator de impacto.

Resumindo…

A pirâmide de evidência tem na base estudos com menor nível de evidência e incluem pesquisas com animais e células, seguidos de relatos e série de casos, depois caso-controle, coorte, ensaio clínico.

As revisões sistemáticas possuem maior nível de evidência e podem ser realizadas com qualquer um dos tipos de estudos já mencionados.

Quem define o tipo de estudo a ser usado é a sua pergunta de pesquisa, bem como disponibilidade de tempo e infraestrutura para realizar.

Um estudo bem delineado, com poucos vieses terá um grau de recomendação elevado e ajudará na tomada de decisão dos profissionais de saúde.

Vamos estender esse post?

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